John Steinbeck: a única história do mundo — o bem, o mal e a fonte da boa escrita


bem e mal    escrita    
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Escrito por: Maria Popova
Traduzido por: Joyce Miller

Sobre a gentileza, o bem e o mal e a fonte da boa escrita.

“Procure entender os homens. Se entendermos um ao outro, a gentileza é mútua. Conhecer bem alguém quase sempre leva ao amor, nunca ao ódio.”

“A bondade e heroísmo se erguerão novamente, então serão derrubados e se erguerão novamente”, John Steinbeck (27 de fevereiro de 1902 — 20 de dezembro de 1968) escreveu ao contemplar o bem, o mal e a necessária contradição da natureza humana no auge da Segunda Guerra Mundial. “Não é que as coisas más vençam — nunca vencerão — mas nunca morrem.”

Uma década mais tarde, dez anos antes de ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, Steinbeck transformou este eterno cabo de guerra entre o bem e o mal em um inquérito literário, em East of Eden (A leste do Éden) —  romance de 1952 que nos apresentou sua bela sabedoria sobre a criatividade e o sentido da vida. Foi adaptado para o cinema em 1955, com o mesmo título, e estrelado por James Dean.

James Dean em East of Eden.
James Dean em East of Eden.

Steinbeck abre o trigésimo quarto capítulo com uma meditação sobre a questão mais elementar de nossas vidas, através da qual a vivenciamos e medimos:

Uma criança pode perguntar: “Qual é a história do mundo?”, e alguém pode perguntar: “Qual caminho o mundo tomará? Como é que acaba e, enquanto estamos nele, qual é a história?”

Acredito que há uma história no mundo, e apenas uma, que nos assusta e inspira. Vivemos uma novela sem fim, suspense eterno. Os seres humanos são apanhados — em suas vidas, seus pensamentos, anseios, ambições, em sua avareza, crueldade, em sua bondade e generosidade — em uma rede do bem e do mal. Acho que esta é a única história que temos e que ocorre em todos os níveis de sentimento e percepção. A virtude e o vício foram as tramas da nossa primeira consciência, e serão a tela da nossa última — e isto apesar de quaisquer mudanças que possamos impor no campo, rio, montanha, na economia e nos modos. Não há outra história. Um homem, depois de ter limpado o pó e a serragem da sua vida, terá deixado apenas as perguntas duras e claras: Era bom ou era mau? Eu fiz o bem — ou o mal?

No nível mais fundamental, o triunfo do bem sobre o mal pressupõe uma curiosidade sincera sobre o que é diferente de nós e uma certa disposição para entender o outro — a escolha moral de entender e honrar a realidade, a experiência, as necessidades das pessoas e entidades que existem além da nossa própria consciência. Steinbeck também enxergou a centralidade do entendimento empático na escolha do bem. Talvez isso não seja surpresa, já que ele usou seu diário particular como uma oficina criativa para seus romances — essa sua percepção originou-se de uma anotação em seu diário.

O elenco The Grapes of Wrath (1940), dirigido por John Ford.
O elenco The Grapes of Wrath (1940), dirigido por John Ford.

Décadas antes, Annie Dillard observou como a generosidade de espírito pode ser a força motriz da boa escrita. Steinbeck se inspira em Hemingway: “Como um escritor você não deve julgar. Deve compreender”,  como pode ser visto em uma anotação em seu diário em 1938. O trecho é citado na introdução escrita pela diretora do Steinbeck Center, Susan Shillinglaw, para uma edição de 1993 de Of Mice and Men (Ratos e homens), publicada pela Penguin Classics:

Em cada escrita honesta no mundo… há um tema básico. Procure entender os homens. Se entendermos um ao outro, a gentileza é mútua. Conhecer bem alguém quase sempre leva ao amor, nunca ao ódio. Há meios mais breves, e muitos. Há escritos que promovem a mudança social, que punem a injustiça, escritos em celebração do heroísmo, mas sempre sobre esse tema básico. Tentem entender um ao outro.

Maria Popova


Maria Popova é a criadora do excepcional Brain Pickings.

Link do artigo original.



Joyce Miller


Tradutora.



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